Um dos maiores youtubers do mundo, o humorista piauiense de 22 anos revela como cria, como vive e como administra a fama e a grana
A não ser pelo nome de batismo, tudo em Whindersson Nunes parece bastante comum. Trata-se de um garoto de 22 anos que não é exatamente um galã, mas que também não é feio. Não chega a ser alto, mas também não é baixo.
Não é magro, mas está longe de ser gordo. Seu apartamento paulistano fica em Moema, bairro de classe média, e é decorado de forma bastante remediada, com móveis de proporções um pouco maiores do que o pequeno imóvel talvez pudesse comportar, o que faz o espaço parecer menor do que de fato é.
Pelo ambiente, que ele divide com a noiva, a cantora e compositora Luisa Sonza, correm dois cachorros simpáticos e inquietos: um vira-lata e um lulu-da-pomerânia, que acreditam poder evacuar onde bem entenderem. Whindersson não liga, não reclama e apenas os afaga.
Mas toda essa trivialidade deixa de existir quando lembramos que Whindersson é o youtuber mais famoso do Brasil. Até o fechamento desta edição, eram pouco mais de 24 milhões de inscritos no seu canal – bem mais
do que outros sucessos nacionais, como o Porta dos Fundos (13 milhões) e o canal 5incominutos, de Kéfera (11 milhões). Na verdade, o canal de Whindersson está entre os dez maiores do mundo, por quantidade de seguidores, e os vídeos que ele posta têm, em média, 10 milhões de views. São números impressionantes e bastante sólidos, e que permitiram que ele comprasse um jatinho de nove lugares (que não custa menos do que R$ 5 milhões) e uma casa de R$ 1 milhão em Fortaleza.
“Tive uma outra vida já, totalmente diferente, nada a ver dessa de querer ser engraçado ou aparecer”, diz Whindersson, que nasceu no dia 5 de janeiro de 1995, em Bom Jesus, uma cidade de 23 mil habitantes que fica a 630 quilômetros de Teresina, no Piauí. Nasceu praticamente dentro do carro a caminho do hospital. “Metade de mim nasceu no carro”, ri. Frequentador de uma igreja evangélica apesar de os pais não serem religiosos, Whindersson não foi o engraçadinho da escola nem o palhaço da família – ele tem dois irmãos mais velhos e uma irmã caçula – e pretendia ser analista de sistemas (“Analista de sistemas ganha uns R$ 10 mil, me disseram”), mas acabou sugado por “esse negócio de internet” depois que a mãe ganhou um computador da empresa em que trabalhava.
Sem camisa e sem frescuras
Whindersson ficou famoso com vídeos de humor que misturam paródias a comentários sobre o seu dia a dia – a não ser pelo fato de ele ser um milionário, é apenas o dia a dia de um jovem qualquer, e envolve temas urgentes para essa geração, como estudos, reprovações, namoro, pais e família. Depois de estourar no YouTube há quase três anos, ele passou também a fazer shows, e chegou a realizar 37 em um único mês. A casa fica sempre lotada e Whindersson é ovacionado. Seu público o adora, e boa parte da explicação para tanta veneração está na simplicidade do seu discurso e na trivialidade da imagem que passa. Nos vídeos ele sempre se mostra sem camisa e sem frescuras, e o fato de não ter vergonha de exibir seu corpo, um corpo absolutamente comum, é um outro motivo para que seja tão admirado.
Numa sociedade cada dia mais preocupada com a imagem, Whindersson joga na cara de todos que vulnerabilidade e trivialidade podem ser um bom negócio. Foi justamente o fato de topar se mostrar sem medos e sem vergonha que fez ele sair da pequena Bom Jesus e virar um milionário antes dos 20 anos.
Whindersson teve, claro, a sorte de nascer numa época e dentro de uma sociedade que enaltecem coisas como vídeos banais de humor no YouTube. Tivesse nascido dentro de um arranjo social que supervalorizasse, por exemplo, leituras dramáticas de Shakespeare no parque, talvez não fizesse sucesso. Mas Whindersson não tem responsabilidade sobre o tipo de entretenimento que as pessoas supervalorizam e gostam de consumir, e apenas surfa o enorme tsunami que se apresentou a sua frente.
Conta um pouco da sua infância. Brincava na rua, era uma coisa mais simples?
Whindersson. É, sempre foi mais simples. Minha mãe e meu pai sempre foram muito “tem que andar na linha”, sabe? Então eu brincava ali dentro do limite. Meus pais nunca me privaram de brincar, de correr, de me sujar e tal, mas também se passasse do limite… Aí levava uns tapas em casa.
O que seus pais fazem? Agora não fazem mais nada, né? [Risos.] Mas eles eram representantes comerciais. Até uns dois meses atrás eles trabalhavam, agora não trabalham mais.
E você agora sustenta eles? É.
Você sempre foi de fazer graça? Não. Minha família sempre foi engraçada, entendeu? Minha galera sempre foi engraçada, mas eu, quando era criança, acho que era mais da imaginação, criava as coisas na minha cabeça.
Não era o engraçadinho da escola? Não.
Você era bom aluno? Mais ou menos. Eu era inteligente, sempre fui esperto, inteligente assim. Por exemplo: eu quase sempre perdia o ano, mas no final eu tinha que passar e aí estudava e passava.
Seus pais são religiosos, têm um código moral muito rígido? Não.
Mas você cantava na igreja. Cantava, mas fui porque eu quis mesmo. Só eu, da minha casa, era evangélico. Todo mundo lá em casa é cristão, né?, mas não assim de ir à missa toda hora, não era galera religiosa, não.
E o que levou você para a igreja? Tinha um amigo meu que me infernizava para ir à igreja com ele. Infernizar… [risos], não dá para usar as palavras infernizar e ir para a igreja juntas, né? Mas aí teve uma hora que eu falei: “Tá! Vou ver qual que é esse negócio aí de ir à igreja”. Daí fui, meus amigos sempre iam, então estava lá com meus amigos e peguei gosto. Fiquei até os 18 anos, entrei com 7.
Você só cantava ou seguia o livro também? Seguia o livro. De apagar todas as músicas que não eram de Deus do celular, de ler a Bíblia sempre, toda tarde ler um capítulo.
Só você na sua casa fazia isso? Só eu.
Que curioso. É curioso, né? Por influência de ninguém na minha casa. Na verdade, minha mãe nem gostava que eu fosse à igreja. Não porque eu ia à igreja adorar Deus, mas porque mãe do interior e pai do interior não gostam desse negócio de filho ficar saindo de casa, entendeu? “Não vai trabalhar, então fica em casa.” Interior é mais assim, né? Tipo: “Vou sair pra tal lugar”. “Não vai!”. “Por quê?”. “Porque não é para ir, é pra ficar em casa!”. Mas até que depois eles foram gostando e foram deixando eu ir. Tranquilo.
E nessa época você queria seguir uma carreira mais conservadora? Sim. Eu queria casar com uns 20 anos, com 25 já ter filho. E eu estudava para ser técnico em informática, fui pelo salário da galera. Eu perguntava para os amigos: “Qual de vocês ganha mais?”, e perguntava para os caras da igreja, para todo mundo. Analista de sistemas ganha uns R$ 10 mil, me disseram. Então vou ser analista de sistemas, pensei. Aí botei quente pra ver se conseguia ser analista de sistemas, mas no meio do caminho apareceu esse negócio de internet aí, né?
Você se formou? Fez o ensino médio? Fiz. Ensino médio de manhã e à noite técnico de informática.
Você só tem 22 anos, mas já teve uma outra vida. Tive uma outra vida já, totalmente diferente, nada a ver dessa de querer ser engraçado ou aparecer.
Se quando você tinha 18 anos contassem que você estaria vivendo essa vida de agora, o que você diria?Eu ia falar: “Você tá ficando doido [risos]? Zero chance de acontecer isso”.
Me fala então como aconteceu isso. Minha mãe ganhou um computador como prêmio dado ao vendedor que mais vendia no mês na empresa em que ela trabalhava. Computador era uma coisa de rico, né? E aí ela ganhou e a gente começou a brigar pelo computador, meu irmão que estudava na universidade queria o computador e minha mãe não sabia mexer, aquela coisa. E aí volta e meia eu dava uma pegada escondido e mexia nele. Como na escola eu fazia o técnico em informática, já tinha alguma noção. E foi aí que eu comecei o contato com esse negócio de internet.
Como você virou o youtuber mais famoso do Brasil? Ah, eu não sei. Eu sei que eu gosto muito de fazer as coisas direito quando vou fazer. Se for desenhar, vou aprender a desenhar. Se for para cantar, vou aprender a cantar. E aí quando eu vi essa coisa de vídeo acho que eu fui me desafiando. Falei: “Meu Deus, parece tão fácil fazer isso e eu não tô conseguindo, ninguém quer ver meus vídeos, não tá engraçado. O que que eu tô fazendo de errado?”. E acho que foi aí que as coisas começaram a andar.
Mas teve um dia que você viu alguém no YouTube e falou: “Eu vou fazer isso”? Teve. Eu assistia a todo o tipo de vídeo, esses vídeos de curiosidade, sabe? O PC Siqueira, que é um youtuber antigão, eu via ele falando para a câmera, um formato legal, né? Falar para a câmera é engraçado, pensei. Aí peguei a vontade de fazer. Fiz com um amigo meu na escola. Teve uns 70 views. Era bem pouco.
Quando você entendeu que estava dentro de um negócio? Cara, eu fiz muitos vídeos até saber que eu podia ganhar dinheiro com aquilo. Não fazia ideia de que poderia dar dinheiro. Tanto que meu primeiro vídeo que estourou foi uma paródia, e deu tipo 6 milhões de views. Fui de um vídeo com mil views para um de 6 milhões. E a galera falava assim: “E aí, tá ganhando muito?”. “Ganhando o quê?”, eu perguntava. “Dinheiro, ué.” “Como ganha dinheiro com isso? Me ensina!”
E a partir disso o que aconteceu? Quando esse vídeo estourou eu cresci o olho um pouquinho. Não por dinheiro, mas pelo negócio de assédio, do pessoal em cima – tira foto, faz isso, faz aquilo. Aí eu gostei da coisa.
Essa primeira paródia era o quê? Era sobre reprovar na escola. Era uma paródia daquela música [cantando a música] “Alô, vó! Tô estourado”, uma música bem nordestina. Daí eu fiz “Alô, vó! Tô reprovado, vó. Tô reprovado e o Facebook é o culpado”. Eu postei a paródia no final do ano letivo e a galera se identificou.
Quem é sua audiência? Eita! Assim, eu já fui muito povão, só que agora, como meus temas são variados, volta e meia pega uma galera diferente. Por exemplo: meu público é dos 18 aos 27, a maior parte. A segunda maior parte é dos 28 aos 34, e a terceira é de 13 aos 17. Então tem uma galera de todo jeito aí, entendeu? É que eu não faço muito vídeo sobre a mesma coisa. Tenho vídeo sobre escola, aí pega a garotada. Tenho vídeo sobre doação de sangue, e aí pega a galera da medicina. Tenho vídeo sobre barba, aí pega homens.
E hoje com que frequência você posta? Pode ser que eu poste oito numa mesma semana e um num mês. Vai da vontade que eu tô de fazer.